Em meados dos anos 1960, o então Sargento Martinho viu um
colega de farda se formar em Direito. Sargentos advogados, naquele tempo, não
era coisa comum, e os colegas de patente, orgulhosos do feito do companheiro,
combinaram ir à formatura fardados para prestar homenagem ao sargento e
advogado Xavier.
Ocorre que o formando resolveu tirar férias e não convidou
nenhum dos amigos de trabalho para a formatura. Indignados com a desfeita, todos
os sargentos, inclusive Martinho, resolveram dar um “gelo” no colega a quem
tacharam de novo burguês. Ninguém falava com o coitado que, inocentemente, não entendia o que estava acontecendo. Certo
dia, o rejeitado Sargento Xavier encontrou-se com Martinho da Vila em um bar e
resolveu passar o assunto a limpo. Depois de muita insistência, Martinho
resolveu contar o motivo do desprezo.
Aliviado, o novo advogado esclareceu a situação. Na verdade,
nem mesmo ele havia ido ao baile de formatura. Salário de sargento era baixo e
não dava para comprar paletó, beca, anel e outras exigências formais para
participar do evento. Informou, ainda, que recebera o “canudo”, posteriormente, diretamente
do diretor da faculdade.
Embora ganhasse a vida como sargento, Martinho da Vila já
era um bom compositor na época e a história foi um grande argumento para compor
“O pequeno burguês”, um dos maiores sucessos do grande sambista de Vila Isabel
e, até hoje, considerada um verdadeiro hino dos vestibulandos vitoriosos.
A história foi contada pelo próprio Martinho, no Programa
Sarau, apresentado pelo jornalista Chico Pinheiro. Ouça a música.
Letra:
Felicidade!
Passei no vestibular
Mas a faculdade
É particular
Particular!
Ela é particular
Particular!
Ela é particular...
Livros tão caros
Tanta taxa prá pagar
Meu dinheiro muito raro
Alguém teve que emprestar
O meu dinheiro
Alguém teve que emprestar
O meu dinheiro
Alguém teve que emprestar...
Morei no subúrbio
Andei de trem atrasado
Do trabalho ia prá aula
Sem jantar e bem cansado
Mas lá em casa
À meia-noite
Tinha sempre a me esperar
Um punhado de problemas
E criança prá criar...
Para criar!
Só criança prá criar
Para criar!
Só criança prá criar...
Mas felizmente
Eu consegui me formar
Mas da minha formatura
Não cheguei participar
Faltou dinheiro prá beca
E também pro meu anel
Nem o diretor careca
Entregou o meu papel...
O meu papel!
Meu canudo de papel
O meu papel!
Meu canudo de papel...
E depois de tantos
anos
Só decepções, desenganos
Dizem que sou um burguês
Muito privilegiado
Mas burgueses são vocês
Eu não passo
De um pobre coitado
E quem quiser ser como eu
Vai ter é que penar um bocado
Um bom bocado!
Vai penar um bom bocado
Um bom bocado!
Vai penar um bom bocado
Um bom bocado!
Vai penar um bom bocado...
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