sábado, 27 de dezembro de 2014

A história da música "Onde Andarás", de Caetano Veloso e Ferreira Gullar.


1Em 1968, Caetano Veloso lançou seu primeiro LP individual. A obra, por revolucionária, iria se transformar numa das mais importantes da história da MPB. No disco surgiria a primeira menção ao termo “Tropicália” como referência musical do movimento que iria abalar as estruturas da MPB – o tropicalismo. O neologismo Tropicália foi criado por Hélio Oiticica, não para o movimento musical, mas para denominar a instalação que montara para uma exposição no Rio de janeiro, em 1967. Depois, por sugestão do cineasta Luiz Carlos Barreto, Caetano, até com certo receio, deu o nome à música, dando o mote ao nome do antológico movimento. A história é por demais conhecida e é contada em vários livros sobre a MPB, motivo pelo qual não irei me estender.
O foco do post é uma música componente desse antológico disco de tantos fatos curiosos. “Onde andarás” é uma parceria do compositor baiano com o poeta Ferreira Gullar que sequer tinha relacionamento com Caetano. A letra, na verdade, foi feita a pedido de Maria Bethânia que desejava um tema ligado a dor de cotovelo para gravar no seu disco de estreia. O imortal escreveu dois textos, Bethânia repassou  para seu irmão Caetano que, no entanto, musicou apenas um deles. Em uma entrevista dada ao Jornal CINFORM, de Aracaju, Gullar teorizar, que do segundo texto não aproveitado, Caetano teria se inspirado para compor alguns argumentos para “Alegria, alegria”, música que iria entrar para história da MPB. Veja um trecho da entrevista.
"Cinform – Você foi parceiro de Caetano Veloso com o poema "Onde Andarás", que faz parte do seu primeiro LP individual prensado em 1968. Em que circunstância ocorreu a parceria e por que não houve continuidade como a estabelecida com Raimundo Fagner com quem tem vários poemas musicados: Traduzir-se; Me Leve – cantiga para não morrer; Rainha da vida. Contigo e outras?
Ferreira Gullar – Essa parceria não nasceu de uma relação minha com Caetano. Foi a Maria Bethânia que me pediu, se eu gostaria de escrever para ela duas letras de fossa, de dor-de-cotovelo que ela queria gravar no seu disco de estreia. Então fiz e entreguei a ela duas letras, uma é "Onde Andarás" e a outra é um poema que também é do mesmo livro, que eu adaptei para servir como letra, porque como poema era muito longo. Mas Caetano só musicou uma delas, o outro poema eu acho que inspirou "Alegria Alegria", porque fala "atravessa a rua, entra no cinema" é um poema urbano, que fala exatamente da cidade e o enfoque é o mesmo e o fato dele não ter posto música na minha letra e ter escrito "Alegria Alegria" dá a impressão de que ele achou melhor criar uma letra sobre aquele assunto. Existe na música "Alegria Alegria" uma expressão que é de um poema meu "o sol se reparte em crimes" isso é de um poema que diz assim: "A tarde se reparte em yorgut, coalhada, copos de leites" esse uso do verbo repartir nesse sentido é do poema "Na Leiteiria". "A tarde se reparte em copos de leite", "o sol se reparte em crimes/espaçonaves guerrilhas". Tudo bem, a função da poesia é essa, o poeta inventa as expressões e o artista popular, o compositor não tem essa função - é muito mais a de comunicar de maneira ampla com o público, não é de mudar a linguagem, de reinventar a linguagem isso é mais dos poetas [...].
Outro fato curioso na gravação de “Onde Andarás”  é Caetano, em um trecho da música, cantando com a voz impostada, numa caricata tentativa de imitar o estilo de grandes cantores da velha guarda como Orlando Silva e Nelson Gonçalves. Apesar da sua beleza, “Onde andarás"” não se tornaria um grande sucesso, mas caiu no gosto de conhecidas cantoras brasileiras. Além da própria Maria Bethânia, Marisa Monte, Joanna, Gal Costa e Adriana Calcanhoto gravaram a música. Ouça a roupagem de cada uma delas e confira o estilo inusitado de Caetano. Escolha a sua melhor versão.
Maria Bethânia


Marisa Monte


Adriana Calcanhoto


Joanna e Gal Costa


Caetano Veloso


Letra:
Onde andarás nesta tarde vazia
Tão clara e sem fim
Enquanto o mar bate azul em Ipanema
Em que bar, em que cinema te esqueces de mim
Enquanto o mar bate azul em Ipanema
Em que bar, em que cinema te esqueces…
Eu sei, meu endereço apagaste do teu coração
A cigarra do apartamento
O chão de cimento existem em vão
Não serve pra nada a escada, o elevador
Já não serve pra nada a janela
A cortina amarela, perdi meu amor
E é por isso que eu saio pra rua
Sem saber pra quê
Na esperança talvez de que o acaso
Por mero descaso me leve a você
Na esperança talvez de que o acaso
Por mero descaso
Me leve... eu sei.
 
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2 comentários:

  1. Parece que o poeta deu uma viajada, o nome do poema nem é este.

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  2. Desconhecia o enredo dessa canção tão bonita. Gosto de saber quando por trás de por trás de canções bastante conhecidas há histórias nem tanto.

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