domingo, 20 de setembro de 2009

Onde Andará – Geraldo Vandré.


“... Vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer...”. O refrão de “Pra não dizer que não falei das flores” tornou-se uma exaltação contra a ditadura militar imposta aos brasileiros por longos 20 anos, no período de 1964 a 1985.

Geraldo Pedrosa de Araújo Dias, o conhecido Geraldo Vandré - Vandré era uma homenagem ao pai, o médico José Vandregísilo - é o autor da, talvez, mais conhecida música de protesto da história da MPB, considerado um verdadeiro hino contra os anos de chumbo do golpe. Em decorrência do incômodo provocado aos militares, o autor de “Fica Mal com Deus” teve que se auto-exilar no Chile, em 1969, receoso das possíveis conseqüências da provocação, já que afrontar a ditadura era sinônimo de perseguição, prisões, torturas e até assassinatos.

Com efeito, “Pra não dizer que não falei das flores” foi um calo nas botas dos militares golpistas e, portanto, logo foi censurada, fato comum naqueles tempos negros do regime de exceção, afinal, por muito menos muita gente já havia sido presa e sujeita aos abusos de um sistema totalitário.

Diante deste cenário vergonhoso, muitos comentários foram suscitados em relação ao criador de Disparada, como supostas prisões, torturas brutais e engajamento em grupos políticos, fatos peremptoriamente negados pelo compositor. Embora tenha destroçado a versão corrente de que foi torturado, muita gente insiste em não acreditar na declaração do cantor. O certo é que o temperamento reservado e polêmico de Vandré, normalmente pouco afeito às convenções sociais, arredio à exposição à mídia e econômico nas entrevistas, somente cria um cenário místico em relação a sua biografia.

E onde anda Geraldo Vandré? O compositor, paraibano, nascido em João Pessoa, hoje mora em um pequeno apartamento em São Paulo, está com 74 anos, é advogado. Foi aposentado pelo Ministério da Fazenda por ter trabalhado na extinta Sunab antes de 1968. Continua polêmico, às vezes chega a ser contraditório, brada, ironicamente, que desconhece quem é Lula, continua criticando o sistema, confessou que votou para presidente apenas uma vez: no Marechal Lott e João Goulart para Vice, em 1960.

Curiosamente, Vandré chega a falar bem dos militares, chegou a fazer uma música em homenagem a FAB, intitulada Fabiana, justificou a aparente contradição, alegando uma velha paixão por aviões adquirida na infância, paixão que o levou, em 1995, a estar presente a uma comemoração da Semana da Asa, em que cadetes da FAB cantaram a sua composição.

Diz que não acompanha a MPB há muito tempo, preferindo músicas clássicas, responde o motivo da pouca exposição em que se encontra, com uma provocação: “Quero ficar longe dessa realidade que você está”.

Veja trechos das poucas entrevistas concedidas pelo compositor entre 2000 e 2008:

Entrevista concedida em 2000 ao Site CliqueMusic

Só ouço música clássica”.

"Caminhando não era uma canção política. Era um aviso aos militares: ‘Olha gente, desse jeito não dá mais’. Eles (militares) nunca tocaram um dedo em mim". "Sou advogado, o único da minha região. Advogado, porém inútil " (risos).

Entrevista ao jornalista Ricardo Anísio em 2004

Eu disse que havia escrito a canção porque sempre fui um apaixonado por aviões. Agora, a minha relação com as Forças Armadas hoje, é de muito respeito mútuo. Eles me tratam com dedicação e sabem das minhas questões existenciais.” Sobre a música Fabiana.

Quando voltei do exílio, no final de década de setenta, meus companheiros me receberam com decepção, porque eu estava vivinho da silva, e eles me queriam mártir e morto. Seria para eles mais uma bandeira. E eu voltei doente e meio perdido em meu país, quando justamente os militares me acolheram e me deram tratamento médico, e me alojaram. Essa é uma relação de seres humanos e não de instituições. Outra coisa, tem que se acabar com essa idéia de que dentro dos quartéis todo mundo será sempre de direita. As coisas mudaram, e a tendência dos jovens oficiais hoje é mais de esquerda, ou de centro, na pior hipótese. Não foram as Forças Armadas as responsáveis pelos anos de ditadura, mas sim os homens que estavam à frente delas naquele momento.” respondendo como nasceu a relação de respeito entre o autor de um hino anti-militarista e os militares?

Nunca! Nem sequer fui exilado, porque escapei do país antes que me prendessem e me exilassem. Saí do Brasil sem que me encostassem um dedo sequer, embora soubesse que era considerado de alta periculosidade pelo SNI (Serviço Nacional de Informações).” Respondendo se havia sido torturado.

Entrevista para ao Correio Brasiliense em 2008

Eu parei ali. Acabou a carreira. Não tive mais carreira.” Sobre o Ai-5.

Estou fora de atividade comercial. Eu estudo música, tenho uma canção que escrevi para a Força Aérea, Fabiana, mas que não foi gravada comercialmente.” Instado se continuava compondo.

Essa é a realidade. Vocês querem a do sofrimento. Não vende jornal não, né?” reiterando que não era verdade que havia sido preso ou torturado.


Tenho muita coisa para fazer, não dá tempo de sentir saudade.” Respondendo se sentia saudade da década de 70.

Meu caminho não é esse, não, nunca foi”, respondendo se o seu objetivo, na década de sessenta, era fazer guerrilha com violão.

Atualização: o segundo vídeo mostra uma raro registro de Geraldo Vandré, em um  show de um amigo, o Sargento Lago, realizado em 2008.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

6 comentários:

  1. Geraldo me parece um daqueles utópicos que não resistiu ao mundo empírico... um mundo bem diferente do idealizado. O poeta é extremamente sensível e tem facilidade de se decepcionar. É a voz silenciosa dos oprimidos que não tem eco e acaba amordaçada pelo medo. É a maior perversão e agressão as mentes brilhantes... infelizmente!

    ResponderExcluir
  2. Não vivi a época, mas Geraldo Vandré é um icone na história do Brasil. Um verdadeiro cidadão. Comungo da idéia de que a arte se massificou e perdeu a essência. Os cordões continuam a vargar, só que em maior numero. Num mundo de miséria temos políticos sensacionalistas e corruptos. Ainda encontramos idiotas que dizem que os políticos devem mudar o país, a imbecilidade é tamanha que não percebe que quem manda verddeiramente é o POVO. Parabéns VANDRÉ!

    ResponderExcluir
  3. ... nunca aconteceu nada com ele !!! tem amigos na aeronáutica... nnca foi alvo da ditadura ...

    ResponderExcluir
  4. para mim Vandré é o maior letrista e melodista da história da música popular brasileira - tenho os cinco vinis que compõem sua obra completa.

    ResponderExcluir
  5. adoro as musicas, tenho o maior carinho por ele e sei que é amado por muitos de nós que viveram ä sua época, que vibraram com os festivais. Geraldo Vandré é para sempre!!!

    ResponderExcluir
  6. Tenho 50 anos de idade. Hoje por curiosidade pesquisei "onde anda Geraldo Vandré', CONFESSO que fiquei meio decepcionado com que li acima, pois, o que se publicava e comentavam antes da era internet é totalmente diferente do que mostra o texto acima. Lembro no final da decada de 70 eu ainda menino de comentarios que o Vandré tinha sofrido lavagem cerebral do regime militar, e parece que levou mesmo, afinal o cara está falando bem dos militares, e me parece ser o unico que fala bem dos anos de chumbo. Fiquei voando nessa.

    ResponderExcluir