sábado, 6 de março de 2010

Johnny Alf é tudo.

‘Johnny é tudo’”.
(João Gilberto)


Apesar da morte de Johnny Alf, tenho pelo menos um consolo: tive o prazer de assistir um show do cantor, no saudoso Projeto Pixinguinha, em temporada no nordeste, no final dos anos 70.

A partir daquele momento, ainda jovem, percebi a importância do artista para a música brasileira. Não é exagero imaginar que, em qualquer relação de grandes representantes da música brasileira, Johnny Alf, certamente, deveria ser lembrado como um ícone.No entanto, mesmo sendo respeitado pela grande maioria dos críticos e amantes da música, paradoxalmente, seu nome nem sempre é colocado em primeiro plano, a exemplo das celebrações dos 50 anos da bossa, onde o compositor, considerado um dos precursores do movimento, foi praticamente ignorado.

O cantor era querido e reverenciado por seus pares, partiu de João Gilberto, por exemplo, a mais curta e mas lúcida definição da importância do compositor: "Johnny é tudo", outros artistas também deram declarações comoventes sobre as qualidades do cantor:

"Era fã dele desde antes de existir jovem guarda. Foi precursor de um gênero. Fiz minha homenagem em meu último disco e gostaria de tê-lo comigo no palco para o DVD, mas ele ficou doente bem no período. Uma vez, Roberto [Carlos] me ligou e eu estava justamente num ensaio com Johnny. Eles conversaram muito naquele dia, eram amigos de longa data. Fiquei feliz de ter refeito essa ponte entre os dois."

(Wanderléa, cantora)

"Johnny Alf não tem tamanho. Imagine que Tom Jobim o seguia em boates para vê-lo tocando piano, ficava enlouquecido com aquelas harmonias. Quando vai embora um compositor como ele, o que acontece às intérpretes que, como eu, não têm talento para compor? Morrem junto, um pouco."

(Claudette Soares, cantora)

"Ele foi um dos precursores da bossa nova, ao lado de Dick Farney e Lúcio Alves. Com 16, 17 anos, entrei muitas vezes escondido no bar do hotel Plaza [na zona sul do Rio] para vê-lo tocar. Quando a minha geração chegou, ele já tinha lançado as sementes: sambas-canções modernos, influências de jazz, letras coloquiais, superdiscretas, para se sussurrar no ouvido. Eram composições menos derramadas, exibidas, mais classe média, cool. Ele tocava por cifra. Achavam que era macumba, mas na verdade era uma maneira de escrever os acordes que vinha do jazz."

(Carlos Lyra, cantor, compositor e violonista)

"Minha primeira sensação é de pesar pela perda de um grande músico. Não posso deixar de enfatizar o nome e a personalidade que era Johnny Alf. O que a gente herda dele é incalculável. Envie meus pêsames a todos os que estão envolvidos [com o cantor] e meus sentimentos de perda e de tristeza."

(Oscar Castro-Neves, cantor e instrumentista)

"Para nós que pertencemos a um momento importante da música brasileira, sem dúvida nenhuma, perdemos um ícone, uma pilastra. A gente só lamente e vai chorar por muito tempo. Tom Jobim dizia que antes mesmo de lançar a Bossa Nova, tinha respeito por Johnny Alf. O caminho para a Bossa Nova foi aberto por ele. Perder Johnny Alf é perder uma referência maravilhosa e uma pilastra da cultura popular, uma cultura de altíssima qualidade, que ele sempre impôs."

(Pery Ribeiro, cantor e compositor)

O carioca, filho de um cabo do exército que morreu na revolução constitucionalista de 1932, teve uma origem simples, sua mãe era doméstica, com poucas condições financeiras. Foi criado na casa de uma família, onde a mãe trabalhava. A madrinha percebeu seu talento e financiou seus estudos de piano clássico dos 10 aos 14 anos. No Instituto Brasil Estados Unidos - IBEU, onde estudou, teve os primeiros contatos com o jazz, lá recebeu o apelido famoso, Johnny Alf – uma alusão a Alfredo, Alfredo José da Silva, seu nome de batismo. Sempre se mostrou simples, até para explicar origem da sua inspiração: apontava para o coração e dizia “Vem daqui de dentro”.

Um câncer de próstata nos privou da bela voz e piano do compositor de “Eu e a Brisa","Ilusão à Toa", "Rapaz de Bem", "Seu Chopin", "Desculpe" e tantas outras. O autor das obras, infelizmente, não chegou a ser um grande sucesso de público, não reclamava do suposto esquecimento dos fãs e até discordava da avaliação, declarou um ano antes de morrer: “Tenho um público muito grande. É interessante isso: você se afasta, mas o pessoal não esquece”, fato ou não, de acordo com a revista Fórum, terminou sua vida com poucos recursos.

Johnny Alf lutava contra a doença há 10 anos, faleceu na última quanta-feira, 4-03-2010, aos 80 anos, em Santo André na grande São Paulo, uma grande perda para a música. Resta agora se fazer justiça, ainda que tardia, ao nome de um artista de estilo refinado e cheio de bossa.


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