O baiano Dorival Caymmi, um dos maiores ícones da música brasileira, chegou a fazer um curta-metragem em Fortaleza, a bela capital do ceará. O cenário do filme foi famosa a praia do Mucuripe, uma das referências turísticas do Ceará, naquele tempo, uma aprazível comunidade de pescadores, sem os monstruosos prédios que a transformou em um imenso paredão de tijolos que escondem seus encantos naturais.
Caymmi, em 1941, passou uma temporada de aproximadamente dois meses em Fortaleza para atuar como um autêntico pescador cearense em um documentário. A produção denominada “A jangada” foi patrocinada pelo DIP, o polêmico Departamento de Imprensa e Propaganda do Governo Getúlio Vargas, que estava patrocinando documentários sobre as praias brasileiras. O filme tinha como argumento uma música do baiano chamada “A Jangada Voltou Só”.
Rui Santos era o cinegrafista do filme. O roteiro de Henrique Pongetti, o mesmo do espetáculo Joujoux e balagandãs, falava das tragédias do pescador nordestino, que, em suas jangadas de piúba, se arriscavam a acidentes no mar na busca pela sobrevivência.
A história está amplamente relatada no livro “O mar e o tempo”, escrito por Stela Caymmi, neta do compositor baiano.
Quem também registrou o fato foi o falecido jornalista cearense Branchard Girão, em seu delicioso livro “Mucuripe. De Pinzon ao padre Nilson”. Com base em depoimento de Bethsaida, conhecida com Dona Záida, uma professora, filha de um jangadeiro da comunidade, que contracenou como esposa do pescador no filme. Branchard dedica cinco páginas sobre o assunto, inclusive sua tentativa, infelizmente inútil, em localizar o filme, com a ajuda do pesquisador Nirez. O documentário, de acordo com Girão, ao que parece, foi definitivamente perdido ou destruído – não se sabe... Entretanto, resta um consolo: na biografia de Caymmi, escrito por Stela Caymmi, na página 196, é disponibilizada uma única foto das filmagens do documentário (foto do início deste post).
Sobre o filme, Dona Záida deu o seguinte depoimento: “Dorival veio em companhia da sua esposa Stela Maria. Corria o ano de 1941 e eu concluíra havia pouco o curso de professora na Escola Normal Justiniano de Serpa. Na época, na força dos meus 19 para vinte anos, resumia o tipo ideal de uma praiana – morena, longos cabelos negros, sem ser ignorante, mas não tão sabida...Caymmi e o diretor do filme estiveram no Mucuripe à procura de uma moça para contracenar com ele no filme ‘ A Jangada Voltou Só’. Surgiram várias candidatas, mas quando eles me viram acharam que era aquilo mesmo que desejavam. Por causa do meu tipo praiano”.
De acordo com a protagonista, o filme tinha pouquíssimos diálogos, focava Caymmi cantando “A Jangada Voltou Só” em um belo cenário natural repleto de dunas e cajueiros da então pouco explorada praia cearense. O filme se iniciava em frente a uma das muitas choupanas de pescador, habitantes, à época, majoritários do bucólico local. Dali o casal de mãos dadas, corria para a jangada deslizando sobre rolos até alcançar o mar.
Záida conta que Caymmi achava que devia ter um beijo na despedida do pescador, idéia contestada de imediato pela nativa: “não, Caymmi, pescador não costuma beijar a mulher na despedida. Isto ficaria fora da realidade”. Embora o argumento fosse verdadeiro, o motivo real da recusa era que Záida estava prestes a se casar e ficaria constrangedor para o noivo ver a cena. Curiosamente, a improvisada atriz nunca teve uma oportunidade de ver o seu filme.
A esperança é que , quem sabe, um dia, a película seja recuperada.
A esperança é que , quem sabe, um dia, a película seja recuperada.
Ouça a música tema do filme.
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